
A violência sexual contra crianças e adolescentes tem crescido de forma alarmante no estado do Amazonas, revelando uma dura e dolorosa realidade: a maioria dos abusos ocorre dentro do próprio lar, muitas vezes cometidos por pessoas em quem a vítima mais confia.
Apenas nos três primeiros meses de 2025 foram registrados 197 casos de estupro de vulnerável no estado, o que representa um aumento de quase 4% em relação ao mesmo período de 2024. Mais de 80% dessas ocorrências aconteceram dentro da casa da vítima, tendo como agressores pais, padrastos, tios ou outros familiares próximos.
O cenário é ainda mais preocupante quando se observa os dados do Atlas da Violência, que analisou registros de 2013 a 2023. O levantamento apontou que 67,8% dos casos envolvendo crianças de 0 a 4 anos aconteceram dentro de casa. Já entre crianças de 5 a 14 anos, o número chega a 65,9%. Esses dados escancaram uma triste verdade: o ambiente doméstico, que deveria ser sinônimo de proteção, tem sido palco de sofrimento e violação de direitos.
Casos como o de uma adolescente de 16 anos, em Manaus, chocam e comovem. Durante uma atividade de redação na escola, ela teve coragem de relatar os abusos sexuais sofridos do próprio pai desde os 14 anos. No texto, descreveu que os episódios ocorriam todas as noites e, ao final, escreveu um pedido comovente: “Eu não quero viver esse sofrimento que ele faz todas as noites comigo.”
O relato da adolescente foi entregue à escola, que imediatamente acionou o Conselho Tutelar. O conselheiro Marcos Lima reforçou a importância de dar voz às vítimas e de prestar atenção aos sinais que elas emitem, por mais sutis que sejam. “Recebemos uma denúncia muito forte. Uma adolescente escreveu uma carta contando os abusos sofridos dentro de casa. O agressor era o próprio pai, a quem ela mais deveria poder confiar.”
A Delegada Juliana Tuma, da Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), também fez um apelo: “Se você não se sente seguro para contar dentro da sua casa, fale com um adulto de confiança, com um professor. Não guarde segredo. Se alguém te pedir para esconder, conte. Não existe segredo entre adultos e crianças.”
No Brasil, a violência sexual infantil continua sendo um dos crimes mais subnotificados. Em muitos casos, as vítimas são silenciadas pelo medo, pela vergonha ou pela dependência emocional e financeira em relação ao agressor. Somente em 2023, foram notificados mais de 26 mil casos de violência sexual envolvendo crianças de 5 a 14 anos, segundo dados preliminares do Ministério da Saúde.
A denúncia é o primeiro passo para quebrar o ciclo da violência. Qualquer pessoa pode e deve denunciar casos suspeitos pelo Disque 100, pelo Conselho Tutelar ou diretamente às autoridades policiais.